22/07/2021 08h41
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Realizada por iniciativa da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), a segunda roda de conversa abordou o protagonismo e os desafios do feminismo negro

Dando continuidade às celebrações do Dia da Mulher Negra, comemorado anualmente em 25 de julho, a Câmara Municipal de Sorocaba promove a “Semana da Mulher Negra, Latina e Caribenha”, com uma sequência de debates sobre o tema, envolvendo militantes negras. Na terça-feira, 20, o debate foi em torno do feminismo negro. A iniciativa é da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), autora Lei 11.812, de 9 de outubro de 2018, que instituiu a data no âmbito municipal. Nacionalmente, a data foi instituída pela Lei 12.987, de 2 de junho de 2014, que criou o “Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra”, também comemorado em 25 de julho.

O debate sobre feminismo negro foi mediado por Maria Tereza Ferreira, idealizadora do “Projeto Enegrecendo”, e contou com a participação das seguintes ativistas do feminismo negro: Luciana Leme, professora de educação física e ativista do Unegro e do movimento LGBT; Patrícia Ferreira, advogada, presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB e presidente da bancada jurídica do Nucab (Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros); e Michele Barão, farmacêutica, doutora pela USP e secretária de finanças do Coletivo Negro Minervino de Oliveira, de Sorocaba.

Feminismo interseccional – A professora Luciana Leme discorreu sobre o “feminismo interseccional”, que surgiu no final da década de 70, nos Estados Unidos, com Kimberlé Williams Crenshaw (hoje com 62 anos e professora de Direito da Universidade da Califórnia), que, na época, como aluna de Direito, foi barrada, com outros amigos negros, no diretório acadêmico. “Seus colegas negros acabaram sendo aceitos, mas ela, como mulher negra, continuou sendo discriminada”, conta. A partir daí, Kimberlé Williams passou a refletir sobre os vários recortes da discriminação (raça, gênero, contexto social etc.) levando o feminismo interseccional a ganhar força, juntamente com o trabalho de outras pensadoras negras, como a filósofa Angela Davis (77 anos), a socióloga Patricia Hill Collins (73 anos) e, no Brasil, a antropóloga Lélia Gonzalez (1935-1994) e a escritora Conceição Evaristo (74 anos). 

A advogada Patrícia Ferreira fez uma síntese das teorias sobre o patriarcado, buscando mostrar as diferenças entre o surgimento da propriedade privada na Europa, em que a mulher se constitui numa propriedade do homem, no momento de formação dessas sociedades, e as sociedades africanas baseadas na agricultura, “em que a mulher surge como a mantenedora, a que vai sustentar a sociedade, com muito mais liberdade”. A advogada discorreu sobre as muitas nuances da luta da mulher negra, que, em dado momento, esbarra na própria mulher branca, que, no seu entender, acaba, às vezes, sendo beneficiada pelo machismo. Por isso, mesmo valorizando a importância histórica do feminismo, defende que a mulher negra deve pensar de maneira autônoma para se emancipar.

América Latina – A farmacêutica Michele Barão refletiu sobre a mulher negra, latina e caribenha, lembrando que o desenvolvimento histórico da América Latina foi marcado pela mão de obra negra, utilizada como escrava, que, ao conquistar a liberdade, não contou com a devida reparação, passando a viver sem nenhuma estrutura. “E a maioria dessa classe trabalhadora é formada por mulheres negras, que sustentam esses lares. A mulher negra sempre trabalhou, a família negra não poderia sobreviver sem o seu trabalho, muito diferente da mulher branca, que não trabalhava e lutava justamente para participar do mercado de trabalho”, observa, lembrando que a mulher, ao trabalhar nos lares brancos, possibilitou que as mulheres brancas pudessem se emancipar. Em função disso, Michele Barão disse que não se deve romantizar a resistência da mulher negra, mas compreender o contexto da desigualdade social em que isso se dá.

Por fim, Maria Tereza Ferreira, do Projeto Enegrecendo, que fez a mediação do debate, disse que é “fundamental ampliar o olhar para as violências que atravessam os corpos”, lembrando que a mulher negra, além de trabalhadora, é mãe, esposa, companheira e tem uma série de outras características que precisam ser levadas em conta na implementação das políticas públicas. Com isso, finalizou a roda de conversas sobre o feminismo negro, que integra a Semana da Mulher Negra, Latina e Caribenha, e ficará disponível no portal da Câmara de Sorocaba e suas redes sociais.