27/09/2021 07h44
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A iniciativa foi da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), e a audiência contou com a vereadora Iara Bernardi (PT) e exposição de biólogo

Após um ciclo de debates virtuais que tratou do assunto ao longo do mês de setembro, por iniciativa da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), a crise hídrica na região de Sorocaba, também por iniciativa da vereadora, foi tema de debate em audiência pública realizada na Câmara Municipal de Sorocaba, na noite de sexta-feira, 24. Além da proponente da audiência, que a presidiu, a mesa dos trabalhos foi composta pela vereadora Iara Bernardi (PT) e o biólogo André Cordeiro, doutor em Engenharia Ambiental pela Universidade de São Paulo e vice-presidente da Comitê de Bacia do Rio Sorocaba e Médio-Tietê, além de professor associado da Universidade Federal de São Carlos (Campus Sorocaba).

“Estamos com um problema escassez hídrica em toda a Bacia do Tietê e, consequentemente, de Sorocaba. Tivemos um período com chuvas bem abaixo da média e todas as barragens do Rio Paraná e do Rio Tietê estão com baixo volume de água. Mas o problema não é só de estiagem, mas também de gestão da água. Nos últimos anos, houve uma perda total de controle sobre o volume de energia gerada e a gestão do volume de água nos reservatórios. As empresas que gerenciam os reservatórios, geralmente voltadas para a produção de energia, não reduziram a produção de energia elétrica, a despeito da escassez hídrica”, afirmou André Cordeiro, ao iniciar sua palestra sobre o tema, exibindo um mapa das 22 de unidades hidrográficas de todo o Estado de São Paulo, que conta com 21 comitês de bacia.

Perfil da bacia – A Bacia do Sorocaba e Médio-Tietê conta com 35 municípios com sede em seu território, além de partes de outros municípios, cuja sede estão fora da bacia, totalizando 54 municípios. A bacia é dividida em três sub-bacias, metade do Tietê e a outra metade do Rio Sorocaba. A cidade de Sorocaba fica na Sub-Bacia do Médio Sorocaba, mas a maior parte da água que consome vem da represa de Itupararanga, que está na Sub-Bacia do Alto-Sorocaba. Segundo ele, Sorocaba está mais perto da nascente do que da foz do rio, onde o volume de água é menor. André Cordeiro disse que a Bacia do Baixo-Sorocaba, abastecida principalmente pelo Rio Pirapora, também está com problema de volume de água e, no ano passado, já houve litígio por água entre os municípios de Salto de Pirapora e Araçoiaba da Serra, que teve de ser resolvido pela DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica).

André Cordeiro observa que a região onde se encontra a represa de Itupararanga ainda é bastante conservada, mas tem aumentado o uso para a agricultura, inclusive, segundo ele, tem aparecido cultura de soja e plantação de eucalipto, que têm um impacto maior no consumo de água e no meio ambiente. Segundo o especialista, desde o Plano de Bacias de 2006, o Comitê de Bacia já define a região do Médio-Tietê como área crítica de abastecimento, ou seja, o volume de água disponível no ambiente é menor do que a demanda. Um dos conflitos clássicos na bacia, como de resto em todo o Brasil, segundo ele, é o fato de a matriz energética brasileira ser calcada na energia hidrelétrica: “O abastecimento exige que se mantenha água no reservatório, mas a hidrelétrica precisa liberar a água para produzir energia”, afirma, observando que o Comitê de Bacias não tem poder de polícia, mas que, no último ano, foi constituído um comitê de crise, com a participação da Votorantim Energia.

O comitê de crise definiu algumas medidas emergenciais como o estabelecimento de uma cota mínima operacional da represa, a redução da vazão turbinada de 6 metros cúbicos para 3,5 metros cúbicos por segundo, a revisão das outorgas para uso de água e o acompanhamento do plano de contingência das concessionárias. “Se essas medidas não tivessem sido adotadas há cerca de um mês, já estaríamos chegando no limite da represa agora em outubro, mas conseguimos postergar o problema por mais um mês para chegar até novembro para esperar as chuvas”, disse André Cordeiro, ressalvando que os planos de contingência costumam ser feitos quando já está faltando água, quando deveriam ser feitos antes. O biólogo também elencou outros problemas, como a falta de sintonia entre os planos diretores do município e a situação da bacia.

Gravidade da crise – A vereadora Iara Bernardi lamentou que Sorocaba, no seu entender, ainda não despertou para a gravidade da crise hídrica, lembrou a luta para evitar a privatização das águas e do saneamento no governo Fernando Henrique Cardoso e afirmou que o novo marco legal do saneamento, aprovado pelo Congresso Nacional, irá promover esse processo de privatização, que, segundo ela, gerou graves conflitos em outros países da América Latina. Também defendeu a criação de uma Frente Parlamentar Regional de Proteção à Represa de Itupararanga e explicou seu projeto de lei que estabelece bandeiras em relação à situação da represa, sem prever aumento de tarifas, mas para evitar o desperdício de água.

Após a palestra de André Cordeiro, a audiência pública prosseguiu com a participação dos debatedores, que participaram virtualmente. A bióloga Marcela Durante, militante ecossocialista do PSOL, e Diego Ortiz, coordenador do Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MBA), estabeleceram relações entre a crise hídrica e o modelo econômico voltado para o lucro, chamando a atenção para esse conflito de interesses. Viviane de Oliveira, representante da entidade SOS Itupararanga, participou da audiência através de um vídeo previamente gravado, em que falou dos avanços recentes em prol da redução do consumo de água, mas disse que é muito importante garantir uma reserva de água na represa para enfrentar a estiagem, observando que a represa está a um metro do volume morto e que, nos últimos anos, não tem conseguido recuperar seu volume de água.

Outras pessoas também participaram da discussão. Marcelo Zambardino, de Ibiúna, disse que a situação da represa de Itupararanga é muito grave; Elder Frezza, da Floresta Cultural, falou do trabalho da entidade e da importância da vegetação para a questão hídrica; Cláudio Robles defendeu a adoção de um plano de longo prazo para uso da água e o replantio da mata nativa em torno da represa; Rita Viana fez questionamentos ao Saae sobre a campanha de economia de água e o grande número de empreendimentos imobiliários; Mariana Faiad indagou se há possibilidade de captar água de outro local, para deixar a represa descansar. O vereador José Antônio de Oliveira, de Votorantim, mais conhecido como Gaguinho (PTB), criticou o excesso de construção de condomínios no entorno da represa. Denise Correia, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, discorreu sobre a importância do planejamento e da gestão democrática da questão hídrica, enfatizando que a questão está envolvida com outras questões urbanísticas, sociais e econômicas.

Participação do Saae – Representando o Saae, Ivan Flores participou virtualmente da audiência pública e elencou as medidas que o Saae adota diariamente para garantir a qualidade e a distribuição da água, como a construção da Estação de Tratamento do Vitória Régia, que, segundo ele, representa uma importante melhoria na captação de água. Disse que a autarquia tem adotado várias medidas para promover o uso racional da água e elogiou a atuação do comitê de bacias no sentido de criar um movimento para cuidar da represa de Itupararanga. Também anunciou que o prefeito Rodrigo Manga agendou uma reunião com os prefeitos da região e com o promotor Farto Neto para tratar do assunto.