24/11/2021 18h18
atualizado em: 25/11/2021 07h16
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Evento foi realizado a pedido de comissão especial de vereadores e contou com a presença de autoridades e representantes do movimento negro.

A Câmara Municipal realizou, na tarde desta quarta-feira, 24, uma audiência pública para debater a implantação de políticas públicas étnico raciais em Sorocaba, convocada pela comissão especial do Legislativo formada pelos vereadores Fausto Peres (Podemos), Iara Bernardi (PT), Fernanda Garcia (PSOL) e João Donizeti (PSDB). A iniciativa atendeu a solicitação de integrantes do movimento negro sorocabano e dos pais do jovem negro Jefferson Rúbio de Moura, de 17 anos, que foi assassinado com um tiro pelas costas por um policial militar à paisana, no Jardim das Flores, no dia 15 de setembro.

Também participaram da audiência Maria Aparecida Costa Batista (Presidente do Podemos Mulher), Dra. Patrícia Ferreira (presidente comissão resgate histórico negro na advocacia da OAB/Sorocaba), dr. Antônio Carlos da Silva Barros (coordenador de políticas públicas da população negra e indígena do Governo do Estado de São Paulo ), Maria Teresa Ferreira (Projeto Enegrecendo), Viviane Taveira (coordenadora de igualdade racial da Secretaria de Cidadania de Sorocaba), inspetor Ferreira (representando o comandante Agrella da GCM), Drika Martin (presidente da Cufa Sorocaba e conselheira do conselho dos direitos das mulheres de Sorocaba), Genésio Albuquerque (Conseg Sul), Gabriela Pereira (Projeto Ampara), Dra. Maristela Monteiro Pereira (OAB), Dr. Diego Souza (OAB), Carlos dos Santos (Avante Zumbi). assessor Dylan Dantas, entre outros.

Presidindo a audiência, o vereador Fausto Peres lembrou que a audiência foi provocada pelos pais do jovem Jefferson, e pediu minuto de silêncio por ele e por todas as vítimas de discriminação no município. A vereadora Fernanda Garcia também citou os casos dos jovens negros Milton Dinho, Caique dos Santos, Lucas Lopes, Guilherme Mateus Franco, André de Jesus Sena, Vitor Nascimento, além de Jefferson Rúbio, todas vítimas de assassinatos em Sorocaba. “Esse número de jovens mortos em curto período reflete um pouco o que acontece no Brasil”, disse, citando pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que aponta que de 2016 a 2020, 31 mil jovens forma mortos em periferias, sendo cerca de 25 mil negros. “Esse espaço é importantíssimo para que a Câmara venha contribuir com as investigações, cobrar que os culpados sejam punidos, justiça para os familiares e que mais jovens não tenham suas vidas ceifadas”, disse a vereadora, sugerindo a criação de um observatório para coleta de dados estatísticos no município.

A vereadora Iara Bernardi propôs a unidade das entidades que trabalham o tema na cidade e lembrou que este ano a prefeitura cancelou o Fórum de Educação para as Relações Étnicas e Raciais, previsto em lei. “É uma questão que tem que ser esclarecida”, disse. Ela destacou a recriação do conselho municipal da igualdade racial e falou dos trabalhos que deverão ser realizados pelo grupo, principalmente na área da educação. O vereador João Donizeti disse que o assunto é premente na sociedade e que durante a pandemia se aprofundou a crise social. Ele também ressaltou a criação de uma comissão específica na Câmara Municipal para debater a questão racial e disse que o problema de violência nas periferias está em todas as cidades. “É preciso trabalhar a questão em Sorocaba”, disse, lembrando que o racismo é uma questão estrutural no país. 

A Dra. Patrícia Ferreira, representante da OAB/Sorocaba, ressaltou que a quantia de jovens negros mortos é estarrecedora e que o estado brasileiro tem sido a principal fonte de violência, com o argumento de defender o cidadão de bem. “Com essa justificativa vale tudo, matar, jogar em cadeias superlotadas e violando os direitos humanos”. Ela falou sobre a falta de estrutura da Polícia Militar e que é preciso atenção a essa situação. Em nome da OAB, a advogada sugeriu a ministração de cursos sobre direitos humanos e direitos raciais para policiais. Sobre as realizações de pancadões na periferia, Patrícia disse que reflete a falta de oportunidade de lazer e cultura para os jovens e que a prefeitura deveria ouvir os organizadores dos eventos para entender os que eles desejam.

Na sequência, Antônio Carlos da Silva Barros, representando o governo estadual, disse que esteve reunido com familiares do Jefferson e que o fato ocorrido foi uma semente para ampliar a luta em Sorocaba. Ele parabenizou a criação da comissão da Câmara e citou ações realizadas pelo estado, como a Rede SP Afro Brasil, para receber denúncias de crimes raciais, e a implantação das cidades antirracistas, firmando acordo com o Ministério Público, além do projeto Trilhas antirracistas da Secretaria Estadual de Educação nas escolas. Ele também defendeu as cotas em concursos públicos e divulgou a realização de uma Conferência Estadual de Promoção de Igualdade Racial, no dia 20 de fevereiro de 2022. 

Maria Aparecida Costa Batista disse que há muito tempo não via lideranças tão forte no movimento e destacou a dificuldade de unir todos em um mesmo local. Falou que já teve início um projeto de segurança pública com a Secretaria de Cultura para promover políticas públicas para os jovens que precisam delas, interrompido por conta da pandemia.  Lourdes Lieje, do movimento negro, destacou que quando se fala da implantação de políticas públicas étnico-raciais elas já existem, mas não são executadas, lembrando do cancelamento do Fórum de Educação em Sorocaba. Segundo ela, uma das ações da frente parlamentar será o cumprimento das leis em vigor. “Se temos todo processo histórico, o que falta para ser executado?”, questionou, apontando a necessidade de apoio e vontade política estadual e municipal para execução.

Maria Teresa Ferreira falou que a celebração do 20 de novembro, dia da Consciência Negra, não diminui os problemas da comunidade negra e que é necessário um caminho para que as reivindicações possam ser concretizadas. Para ela, o enfrentamento do racismo será possível com a quebra de paradigmas nas áreas de educação básica, políticas de emprego, saúde e segurança pública. Segundo Maria Teresa, a criação do conselho municipal não foi avanço, mas um retrocesso por conta de concessões necessárias. “Nossas reivindicações são ancestrais. Essa comissão não vai inventar a roda, mas atentar para o que funciona. É preciso se debruçar na história do povo negro, no Estatuto da Igualdade Racial, nas leis, nas políticas do município e fazer transversalização de tudo que está escrito”, disse.

Outras pessoas também participaram da audiência com discursos e questões direcionadas aos convidados envolvendo diversos temas, como a necessidade da atenção à comunidade negra portadora de deficiência, as formas de ações policiais e a cobrança por justiça em relação aos casos dos jovens assassinados. A audiência pública foi transmitida ao vivo pela TV Câmara Sorocaba e está disponível no canal do legislativo no Youtube.